BANCO CENTRAL MANTÉM SELIC EM 15% AO ANO E INTERROMPE CICLO DE ALTA DE JUROS

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Copom (Comitê de Política Monetária) do Banco Central decidiu por unanimidade nesta quarta-feira (30) manter inalterada a taxa básica de juros em 15% ao ano e interrompeu o ciclo de alta com a Selic no maior nível em 19 anos.

No comunicado, o colegiado do BC falou em cautela na condução da política de juros diante de um ambiente externo “mais adverso e incerto” e citou explicitamente as tarifas comerciais impostas pelos Estados Unidos ao Brasil, sem mencionar o nome de Donald Trump.

O recado claro veio no mesmo dia em que o republicano assinou a ordem executiva confirmando a aplicação de sobretaxa de 50% a produtos brasileiros, com uma lista de quase 700 exceções.

“O comitê tem acompanhado, com particular atenção, os anúncios referentes à imposição pelos EUA de tarifas comerciais ao Brasil, reforçando a postura de cautela em cenário de maior incerteza”, afirmou.

O Copom também voltou a chamar atenção para a volatilidade dos ativos financeiros em função da política econômica dos Estados Unidos. “Tal cenário exige particular cautela por parte de países emergentes em ambiente marcado por tensão geopolítica”, disse.

guerra comercial aberta pelos EUA e seus efeitos ainda nebulosos desafiam a atuação dos bancos centrais. Mais cedo, o Fed (Federal Reserve, o banco central dos EUA) manteve os juros inalterados no intervalo de 4,25% a 4,50% ao ano pela quinta vez consecutiva, como amplamente esperado pelo mercado.

No comunicado, o colegiado do BC reforçou a estratégia de manter a Selic em nível elevado por um longo tempo para assegurar a convergência da inflação à meta. Para o comitê, é necessária uma política de juros em nível “significativamente contracionista” –ou seja, que contribua para a moderação do crescimento da economia– por período “bastante prolongado”.

Com a manutenção dos juros em 15% ao ano, a Selic fica agora estacionada no maior patamar observado desde julho de 2006. Naquela época, contudo, os juros estavam em trajetória de queda depois de terem atingido o pico de 19,75% ao ano, em 2005, durante o escândalo do mensalão.

O ciclo de alta de juros durou dez meses, de setembro do ano passado a junho deste ano. Ao longo do período, foram realizados sete aumentos seguidos. Nesse processo, a taxa básica foi de 10,5% a 15% ao ano, acumulando elevação de 4,5 pontos percentuais.

A Selic começou a subir na gestão de Roberto Campos Neto, cujo mandato terminou em 31 de dezembro de 2024. O primeiro passo foi gradual, com alta de 0,25 ponto percentual (a 10,75% ao ano). O comitê, então, acelerou o passo pela primeira vez e elevou a taxa básica em 0,5 ponto em novembro (a 11,25% ao ano).

Na decisão que marcou a transição de comando e a despedida de Campos Neto do BC, na última reunião de 2024, o Copom foi mais agressivo e indicou um choque de juros. Em dezembro, fez um aumento de um ponto percentual (a 12,25% ao ano) e sinalizou mais duas altas de mesma intensidade nos encontros seguintes, em janeiro e março.

No começo da nova gestão, o atual presidente do BC, Gabriel Galípolo, cumpriu a estratégia traçada, com duas altas de um ponto, alçando os juros a 14,25% ao ano em março. Depois disso, o comitê passou a desacelerar o ritmo e subiu a Selic em 0,5 ponto em maio (14,75% ao ano) e em 0,25 ponto em junho (15% ao ano).

No encontro de junho, o colegiado do BC antecipou prever a interrupção do ciclo de alta de juros –plano que agora se concretizou.

No comunicado, o Copom sinalizou a manutenção da Selic na próxima reunião, em setembro, para avaliar se a estratégia traçada será suficiente para assegurar a convergência da inflação à meta. “O cenário atual, marcado por elevada incerteza, exige cautela na condução da política monetária”, afirmou.

O comitê repetiu mais uma vez que se manterá vigilante e poderá ajustar os passos futuros da política monetária, dizendo que não hesitará em retomar o ciclo de altas se julgar necessário.

A decisão do Copom veio em linha com a expectativa consensual do mercado financeiro. Levantamento feito pela Bloomberg mostrou que a manutenção da Selic em 15% ao ano era a aposta dos economistas consultados.

Ao analisar o cenário doméstico, o colegiado do BC disse que as expectativas de inflação seguem distantes da meta, as projeções de inflação estão elevadas, a atividade econômica continua mostrando força e o mercado de trabalho segue exercendo pressão sobre os preços.

“O conjunto dos indicadores de atividade econômica tem apresentado, conforme esperado, certa moderação no crescimento, mas o mercado de trabalho ainda mostra dinamismo”, reforçou.

Com relação a trajetória das contas públicas, motivo de preocupação dos economistas, o Copom se limitou a dizer que segue acompanhando como o desenvolvimento da política fiscal impacta a política de juros e os ativos financeiros.

Desde a última reunião, concretizou-se o primeiro estouro da inflação desde que o sistema de avaliação contínua entrou em vigor, em janeiro deste ano. Ao se justificar, o BC projetou que o índice voltará a ficar abaixo do teto da meta a partir do fim do primeiro trimestre de 2026.

O objetivo central perseguido pelo BC é 3%, com intervalo de tolerância de 1,5 ponto percentual para mais ou para menos. A meta de inflação é considerada cumprida se oscilar entre 1,5% (piso) e 4,5% (teto).

Devido aos efeitos defasados da política de juros sobre a economia, o Copom tem hoje a inflação do primeiro trimestre de 2027 na mira.

No cenário de referência do Copom, as projeções de inflação para este ano e para o próximo se mantiveram em 4,9% e 3,6%, respectivamente. Para o 1º trimestre de 2027, a estimativa é de 3,4%, acima do centro da meta.

O comitê reiterou que os riscos para a inflação, tanto de alta quanto de baixa, estão mais elevados do que o usual.

Entre os fatores que puxariam os preços para cima, citou a possibilidade de as expectativas de inflação seguirem longe da meta por período mais prolongado e a chance de maior resiliência na inflação de serviços em função de um hiato do produto mais positivo –quando a economia continua operando acima do seu potencial e sujeita a pressões inflacionárias.

Mencionou também no balanço possíveis impactos provocados por políticas econômicas dentro e fora do Brasil, como uma depreciação do câmbio de forma persistente.

Entre os vetores que levariam os preços para baixo, voltou a falar sobre a possibilidade de desaceleração da atividade econômica doméstica mais acentuada do que a prevista e sobre um recuo global mais forte devido a um choque de comércio e do aumento da incerteza. Repetiu também a chance de alívio na inflação se houver queda nos preços das commodities.

O Copom, que hoje é composto majoritariamente por representantes indicados pelo governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) –com sete dos nove membros–, volta a se reunir nos dias 16 e 17 de setembro.

Fonte:Folha de SP