Reconhecimento decorre de uma ação judicial. Mecanismos de reparação serão analisados, como a criação de um fundo para financiar políticas de igualdade racial.
O governo federal fez nesta quinta-feira (21) um pedido formal desculpas à população negra do Brasil pelas violações sofridas desde a escravidão.
O pedido público de perdão foi verbalizado pelo advogado-geral da União, ministro Jorge Messias, que representou o Estado em uma cerimônia em Brasília.
O pedido faz parte de um acordo firmado entre a União e a Educafro Brasil. Em 2022, a fundação entrou na Justiça pedindo a condenação do Estado por ações e omissões que contribuíram com o racismo no Brasil. A entidade também a reparação de danos causados à comunidade afro-brasileira.
Ao fazer o pedido de perdão, o estado reconhece formalmente o prejuízo causado à população negra no período da escravidão e também após a abolição da escravatura, com a falta de políticas públicas.
O reconhecimento do estado é o primeiro passo do acordo. A partir de agora, o governo federal deve viabilizar a criação de um fundo nacional para financiar políticas de igualdade racial e outras formas de reparação.
Segundo o ministro Jorge Messias, a criação do fundo deve passar pela Junta de Execução Orçamentária, colegiado que reúne ministros do governo para discussão de medidas fiscais.
Também estavam na cerimônia as ministras Anielle Franco (Igualdade Racial) e Macaé Evaristo (Direitos Humanos). Organizações da sociedade civil também estavam presentes, como por exemplo, o Frei Davi, fundador da Educafro.
“A Educafro Brasil continuará trabalhando incansavelmente para que as reparações previstas sejam efetivadas e que a sociedade brasileira, como um todo, assuma seu compromisso com a superação das desigualdades raciais.” Afirmou Frei Davi.
O advogado da Educafro e idealizador da ação, Irapuã Santana, explica que o processo foi construído por uma equipe multidisciplinar e com base em três eixos:
- histórico
- econômico
- psicológico
“O pedido surgiu a partir do que houve em Chicago em 2019, quando reconheceram que tinham que reparar as pessoas negras. Aquilo ficou na minha cabeça, conversei com o Frei Davi para que o processo tivesse um conteúdo sólido e reunimos uma equipe qualificada”, disse.
“Mensuramos o prejuízo, são 157 páginas sobre a questão econômica, foi debatido o impacto no mercado de trabalho, o orçamento público. Por fim, a perspectiva psicológica do racismo. O racismo é tratado como um estresse pós-traumático”, completou Irapuã Santana.
A ministra Macaé Evaristo, dos Direitos Humanos, lembrou que, após a abolição da escravatura, os negros foram abandonados pelo Poder Público, situação que perdurou por muito tempo e que gera consequências até os dias de hoje.
“Temos um estado impregnado pelo racismo, colonialismo, isso está presente”, avaliou a ministra
Durante a cerimônia, a ministra Anielle Franco, da Igualdade Racial, lembrou das dores e impactos que cenários racistas provocam na população negra.
“O que falta muitas vezes na luta antirracista é empatia e respeito, toda pessoa negra tem alguma experiência que toca num lugar diferente. Pra gente chegar aqui, entendendo tudo o que veio antes, mas requer também saber onde a gente quer chegar.” declarou.
A ação movida pela Educafro vai ao encontro de outra ação que está em debate do Supremo Tribunal Federal.
A ADPF 973, chamada de “Arguição das Vidas Negras”, foi ajuizada por sete partidos políticos (PT, PSOL, PSB, PCdoB, Rede Sustentabilidade, PDT e PV), que foram instigados por movimentos da sociedade civil, como por exemplo, a Coalização Negra por Direitos.
A ação pede que a Suprema Corte reconheça a violência do estado ao longo dos anos para com as pessoas negras e também determine que o governo federal adote medidas de reparação e políticas públicas em favor das pessoas negras.
Na ação em debate no STF, a Educafro é “amicus curiae” que significa “amigo da corte”. A função é responsável por apresentar informações relevantes para a solução do caso, mas não pode fazer pedidos ou apresentar recursos, por exemplo.
Durante a cerimônia para o pedido de perdão, a Educafro lembrou da ADPF 973 e pediu que o ministro Jorge Messias proponha ao ministro Luiz Fux, relator da proposta, uma câmara de conciliação.
Fonte: G1